Violência contra a mulher é discutida em audiência pública

O Plenário da Câmara de Vereadores ficou lotado na audiência pública, realizada nesta quinta-feira (31), que discutiu a violência contra a mulher. Propositora da iniciativa, a vereadora Telda Assis (PT), que presidiu os debates, parabenizou a presença do público. "Isso mostra estamos preocupados com essa questão e indica, também, a necessidade de construirmos uma rede de proteção efetiva à mulher em nosso município", disse.
 
A primeira a se pronunciar, a Promotora de Justiça Giani Saad informou que Cachoeira do Sul vem mantendo uma média anual de 550 medidas protetivas a mulheres nos últimos anos. “Podemos pensar, em um primeiro momento, mas não é. Falta empoderamento para que as mulheres vítimas registrem a violência. Essa situação é ainda mais comum no interior, pois a mulher rural é a que mais tem medo de registrar. Realizamos em torno de 28 audiências de Maria da Penha por tarde, com pouquíssimas mulheres rurais”.
 
Canoas
 
Na sequência a coordenadora técnica do Centro de Referência para a Mulher  de Canoas, Renata Jardim, falou sobre a assistência à mulher naquele município. “Hoje temos uma rede completa de atendimento, com juizado especializado, promotoria especializada, defensoria exclusiva, patrulha da Maria da Penha da Brigada Militar, hospital de referência de atendimento de violência sexual e Sala Lilás no Instituto Geral de Perícias. A Coordenadoria das Mulheres, criada em 2009, dialoga com o prefeito, levando as necessidades para organizar ações para que as mulheres se sintam fortalecidas, seguras. O Executivo tem um papel fundamental nesse processo, mas infelizmente vemos que a maioria dos Estados e Municípios têm investido muito pouco na defesa da mulher”.
 
Santa Maria
 
A vereadora de Santa Maria Celita da Silva relatou que seu município é um dos vários que registra dados alarmantes de ocorrências de Maria da Penha. “Temos uma média de mais de três mil registros anuais, mas sabemos que há muito mais. Esse tipo de registro é difícil, pois envolve a família. Segundo a delegada de Santa Maria, 30% das que buscam socorro desistem de levar adiante a questão. Mas não existe mulher que gosta de apanhar, existe medo”.
 
A parlamentar também falou sobre a rede de assistência à mulher em Santa Maria. “Temos uma delegacia especializada, órgãos de atendimento, convênios com universidades nas áreas de psicologia e Direito e casa de acolhimento. Mas também temos problemas. A Coordenadoria das Mulheres e o Conselho da Mulher estão inoperantes. Além disso, em nossos CRAS faltam psicólogos e assistentes sociais”.
 
Cachoeira do Sul
 
A Coordenadora da Coordenadoria da Mulher de Cachoeira do Sul, Jussara Ghignatti, destacou a recente aprovação do projeto de lei que instituiu o órgão. “A atual gestão municipal tem preocupação com a mulher. Antes a Coordenadoria existia por decreto, há pouco a instituímos por lei. Além disso, já estamos organizando um projeto para criar um centro de referência para atendimento à mulher aqui, baseado no modelo de Canoas”, anunciou.
 
Jussara também defendeu a volta do Posto Policial da Mulher, fechado no início desse ano, que centralizava ocorrências policiais e inquéritos relacionados à Lei Maria da Penha, estupros, todo tipo de violência doméstica e outros crimes praticados contra mulheres. “Não tínhamos a delegacia especializada, como há em alguns municípios, mas tínhamos esse atendimento específico. Sugiro que organizemos uma comissão para buscar, junto ao Governo do Estado, a volta do posto em Cachoeira do Sul”.
 
 O prefeito Sérgio Ghignatti anunciou, na audiência púbica, que pretende criar um projeto para conscientizar sobre a violência contra a mulher nas escolas. “Sabemos que muitas mulheres sentem vergonha de denunciar. Por isso, temos que educar nossas crianças. Nossas meninas têm que crescer sabendo que isso não é normal e, quando isso ocorrer, devem procurar os pais ou professores”.
 
11 anos da Lei
 
A deputada estadual Stela Farias (PT) lembrou a passagem dos 11 anos da Lei Maria da Penha, em agosto deste ano. “Durante esse período, tivemos avanços, mas também retrocessos. Parece que damos um passo à frente e dez para trás. O Ministério das Mulheres, por exemplo, que tanto lutamos para criar, foi extinto por Temer assim que assumiu. Alguns ministérios ele incorporou em outras pastas, este ele simplesmente extinguiu”, disse.
 
Para a deputada, tanto o poder público quanto a sociedade devem agir para reduzir os índices de violência. “A sociedade civil não pode ficar calada. Em briga de marido e mulher a gente tem obrigação de meter a colher. Esse tema é dever do Estado e de responsabilidade de todos nós”.
 
Humanização do atendimento
 
A vereadora Daniela Santos (PDT), que falou em nome dos vereadores de Cachoeira do Sul, criticou o atendimento às mulheres quando essas recorrer à delegacia. “O serviço precisa ser mais humanizado. Se uma mulher procura a delegacia é porque não aguenta mais. Ontem mesmo uma amiga minha bem instruída procurou ajuda em razão de uma violência que sofreu do ex-marido e a pessoa que a atendeu na delegacia a olhou de cima a baixo e perguntou se ela usava drogas ou era prostituta. E se fosse? Poderia apanhar?”.
 
Na oportunidade, a vereadora também relatou o que enfrentou depois de sofrer uma violência. “Muitas vezes a violência vem da própria casa, de um vizinho ou de um amigo, que você considera que seja da família. Isso aconteceu comigo. Mas quando isso acontece não podemos nos oprimir e, pensando assim, eu fui à delegacia. Chegando lá, o homem que me atendeu ficou me analisando de uma forma muito incomodativa. Isso automaticamente já nos oprime. A verdade é que sofremos constrangimentos até mesmo para denunciar a situação”.  
 
Daniela ressaltou, ainda, outros tipos de dificuldades que as mulheres enfrentam. “A verdade é que nós mulheres sofremos agressões de todos os tipos. Há pouco tempo fui secretária de Interior de nosso município e muito tive quer ouvir que isso não era trabalho para uma patricinha. Ainda há espaços que parecem que são privativos dos homens”.
 
CREAS
 
Para a assistente social do CREAS, Arieli Castro, a violência contra a mulher está muito naturalizada em nossa sociedade e precisa ser, primeiramente, compreendida para depois ser enfrentada. “Assim como o médico que primeiro faz o diagnóstico para depois tratar, precisamos de profissionais qualificados para ações em prol da mulher”.
 
A assistente social também relatou uma situação comum que enfrentam no trabalho. “Eu e todas minhas colegas já recebemos, durante a madrugada, o encaminhamento de mulheres agredidas, muitas vezes até sangrando, acompanhadas de seus filhos. Mas o que vamos fazer com elas? Não temos recursos, não temos estrutura. Para onde vamos mandar? Levar para nossa casa?”, desabafou.
 
Polícia Civil
 
O último a se pronunciar, o delegado regional de Polícia José Antônio Taschetto Mota garantiu à vereadora Daniela Santos que irá apurar quem atendeu a sua amiga da forma descrita. “Não podemos aceitar essa conduta. Se identificarmos essa situação, o profissional será responsabilizado, não passamos a mão na cabeça de ninguém”.
 
Sobre o fechamento do Posto da Mulher o delegado informou que foi decisão do governo por reaparelhamento. “Sabemos que o chefe da Polícia Civil do nosso Estado pretende instalar aqui uma Delegacia para grupos vulneráveis, que incluiria idosos, mulheres e crianças”, disse.
 
Encaminhamentos
 
Ao final do encontro, foi formado um grupo de trabalho para acompanhar o andamento das ações em prol das mulheres. O grupo é formado por representantes da Câmara de Vereadores, CREAS, UCAB, Coordenaria Municipal da Mulher, OAB/Cachoeira do Sul, Secretaria Municipal da Saúde, Polícia Civil Brigada Militar, universidade e do grupo das trabalhadoras rurais. “Nós não podemos deixar morrer essa iniciativa”, defendeu a vereadora Telda.
 
Presenças
 
O encontro também contou com a participação do presidente da OAB/Cachoeira do Sul, Marcelo Teixeira; dos secretários municipais da Saúde, Roger Gomes da Rosa, e da Educação, Ana Margareth Vivian; da diretora da Procuradoria Jurídica do Município, Juliana Flores; de representantes da Brigada Militar, do Conselho de Igualdade Racial, do Movimento das Domésticas de Cachoeira do Sul e de universidades.
 
Também estiveram presentes os vereadores Paulão Trevisan (PDT), Dr. Carlos Alberto (PP), Jorginho Fialho (PRB), Jeremias Madeira (PDT), Daniela Santos (PDT), Marcelinho da Empresa (PP) e Telda Assis (PT), que presidiu a audiência.